Viva Feijão

Por incrível que pareça, não tinha Feijão na minha casa. A vontade de comer um Feijãozinho era imensa, mas a vontade de sair comprar era mínima… Afinal, estávamos em lockdown, numa época em que pouco conhecíamos o novo vírus. Melhor não arriscar… Revirei o armário em busca de algo cozido a vapor, ou uma lata, nada! Até que a busca virou organização e lá no fundo, bem no fundo do armário, achei um pacote de carioca… vencido… Não vai cozinhar. Não vai fazer caldo. Vai demorar para cozinhar.

Não tinha resquícios de caruncho ou outra infestação de insetos. Foi para a panela. Cozinhou rápido, uma beleza! Caldo cremoso, docinho, branquinho. Uma delícia! Vontade morta, veio a dúvida: que Feijão é esse? Afinal, passou a ser o meu favorito… Não adiantava saber a marca, era a de sempre, mas esse Feijão estava diferente. Restou fotografar o lote e enviar para o empacotador que, ainda bem, mantém registros e descobri a variedade. Agora eu sei o nome e o sobrenome do meu favorito: Feijão-carioca xxxx. E de que adianta? Como vou descobrir se o pacote de carioca do mercado é a variedade xxxx? Não basta ser carioca, não basta ser da mesma marca…

Outro dia aconteceu algo diferente: o Feijão-preto do restaurante estava maravilhoso! E não era o tempero, nem a mão da cozinheira. Era o gosto especial do grão! Nem pedi para ver qual marca era, pois sabia que seria impossível encontrar no supermercado um Feijão com aquele sobrenome…

Sim! Feijão tem nome e sobrenome! Era uma troca de ideias com o melhorista e, com as experiências vividas, passou a ser quase uma obsessão! Afinal, sei que meu vinho favorito é Carmenere, meu café favorito é do sul de Minas, que meu carioca é xxxx. Por que ele não pode ter sobrenome na embalagem também?

Lá estávamos nós no Show Rural, em Cascavel… Estavam servindo caldinho de Feijão, mas não podíamos escolher um dos diversos servidos, tínhamos que experimentar todos e votar. Sim, todos os Feijões tinham nome: carioca. Porém cada um tinha um sobrenome diferente…

Resolvemos repetir a experiência no 8º Fórum do Feijão, em Cuiabá. Recebemos 3 cariocas diferentes: Embrapa, IAC e TAA. Todos têm seu próprio sobrenome, mas, para a “brincadeira” ficar mais divertida e temática, eles foram “rebatizados”: Feijão-carioca Jacaré-do-Papo-Amarelo, Feijão-carioca Arara-Azul e Feijão-carioca Lobo-Guará, afinal estávamos do Mato Grosso. Foram entregues ao chef que os cozinharia, na presença da nutricionista que acompanharia o processo, com as instruções claras e específicas: a mesma pessoa deveria cozinhar a mesma quantidade de Feijão, com a mesma quantidade de água, de tempero e pelo mesmo tempo, em panelas separadas. Quando tudo ficou pronto, lá vieram os 3 caldinhos. Primeira impressão: visualmente um deles era mais escuro que os outros. Segunda impressão: um deles era muito mais espesso que os outros. Por fim: os sabores eram completamente diferentes. Experimenta daqui, experimenta dali, votação difícil: gostei da cor de um, da textura do outro e do sabor daquele outro… Experimenta de novo. Analisa. Que tal usar o método uni-duni-tê? A experiência foi vivida por todos que passavam por ali: pessoal da cozinha, pessoal que trabalhava na organização do evento, produtores, empacotadores, comerciantes, corretores, melhoristas. Não importava se era especialista ou não. Todos tinham a sua certeza: o que eu escolhi é o melhor! Claro! O gosto é seu!! Você tem razão. A sua escolha sempre será a melhor mesmo. Não há que se discutir. Duas horas depois do início da experiência, saiu o resultado da votação: o Feijão-carioca Jacaré-do-Papo-Amarelo foi o mais votado.

Sim, um Feijão-carioca não é igual a outro Feijão-carioca, nem a um terceiro Feijão-carioca. Um Feijão-preto não é igual a outro Feijão-preto. O mesmo acontece com qualquer outra cultivar.

Os técnicos e os especialistas que discutam os porquês dessa variedade, o Feijão-carioca Jacaré-do-Papo-Amarelo, ter ganhado a votação. Que analisem as características. O que importa, para nós, consumidores finais, é que a verdade foi provada: a culpa não é minha se o meu Feijão não fica igual ao da minha sogra!

Por Valéria Lüders

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